A nova política do governo Lula, que prevê universalizar as matrículas de alunos com deficiência em escolas regulares, provoca revolta entre famílias e entidades. Apaes alertam para o risco de fechamento de escolas especializadas e chamam o texto de “retrocesso disfarçado de inclusão”.
A Política Nacional de Educação Especial Inclusiva, lançada pelo governo federal nesta semana, provocou uma onda de preocupação e indignação entre especialistas, pais de alunos e entidades como as Apaes e as Fundações Pestalozzi, que há décadas atuam na formação e acolhimento de pessoas com deficiência em todo o país.
O novo decreto, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, determina que a matrícula de crianças com deficiência seja universalizada em escolas regulares, estabelecendo que o atendimento educacional especializado ocorra apenas no contraturno. Para muitas famílias, educadores e especialistas, a medida representa um retrocesso que pode esvaziar as escolas especializadas e ferir a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB).
“Um decreto não pode tirar nem adicionar direitos. A LDB garante o direito de escolha das famílias e o atendimento preferencial, não obrigatório, em escolas regulares. O novo texto ignora essa prerrogativa e fere a autonomia das famílias”, alerta Lucelmo Lacerda, pesquisador em educação especial da Universidade da Carolina do Norte.
As Apaes, presentes em todos os estados brasileiros, afirmam que não foram ouvidas antes da publicação do decreto. Após uma intensa mobilização nas redes sociais, representantes da associação foram recebidos pelo Ministério da Educação (MEC), que, no entanto, sinalizou não pretender revogar o texto, pedindo apenas sugestões de ajustes.
Para o coordenador nacional de educação da Apae Brasil, Luiz Fernando Zuin, o decreto desconsidera a realidade das crianças com deficiência severa, que necessitam de acompanhamento integral.
“Mesmo com boas estruturas na rede regular, a escola especializada sempre será necessária. Algumas crianças precisam de apoio constante, e o atendimento apenas complementar não é suficiente. O risco de esvaziamento das escolas especiais é real”, afirmou.
A polêmica ganhou força também entre as famílias atendidas pelas instituições. Angélica Siqueira, mulher autista que estudou em escola regular antes de ser acolhida pela Apae, relatou a diferença transformadora que encontrou no ambiente especializado.
“Na escola comum eu era julgada, maltratada, não conseguia acompanhar. Na Apae fui acolhida, aprendi com paciência e respeito. Agora querem acabar com esse espaço que salvou tantas vidas. Um dia eu precisei, e meus filhos também podem precisar”, emocionou-se.
Outro ponto criticado do decreto é a capacitação mínima de apenas 80 horas para professores em educação inclusiva — sem a exigência de formação específica na área. Para os especialistas, isso fragiliza o ensino e sobrecarrega os educadores, que já enfrentam desafios estruturais nas redes públicas.
Apesar das críticas, o Ministério da Educação afirma que a nova política não altera o financiamento das entidades e que o texto ainda passará por regulamentação.
No Congresso Nacional, a discussão já chegou ao plenário. O senador Flávio Arns (PSB) apresentou um projeto de decreto legislativo para tentar derrubar a medida. Segundo o parlamentar, o decreto “fere o princípio da inclusão com qualidade e ignora a importância das escolas especializadas no desenvolvimento de crianças e jovens com deficiência”.
Análise e contexto político:
A decisão reacende o debate sobre educação inclusiva versus educação especializada — tema historicamente sensível e politicamente carregado. Para as entidades, o decreto parte de uma boa intenção, mas desconsidera a diversidade das necessidades reais dos alunos com deficiência.
A pressão sobre o governo deve crescer nas próximas semanas, com manifestações organizadas pelas Apaes e Fundações Pestalozzi em todo o país. Especialistas defendem que o caminho deve ser a integração entre as redes, e não a substituição de uma pela outra.
 
                     
                         
                                                             
                                             
                                             
                                             
                                                                     
                                                                     
                                                                    
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